quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Pais ausentes

Impressionante como se pode escrever torto por linhas retas... Ao contrário de Deus, mas também em seu nome, desamores e horrores são perpetrados. E perpetuam-se ausências e vazios, frutos de desencontros programados, restando a pergunta, cena final de épico da Metro dos anos sessenta: “Pai, porque me abandonaste?”



Verdade ou mais uma licença não poética, mas patética e profética desta vida de cartas marcadas num jogo sem fim - sem ganhadores, sem perdedores nem final feliz: nas ausências dos pais realizam-se os Édipos, mães e filhos sonhando-se e ficando juntos, mais do que ficando, infinitando o proibido encontro: ela, plena e prenha de vida como dantes, ele, pré-infante como quando amarrado/amado por cordão, esperando que ela o dê à luz... na escuridão absoluta, cegueira edípica total, tateia, esperando que ela lhe dê luz.


O que será de nossas crianças meninos? As mulheres buscam homens-provedores-protetores para que cresçam e apareçam, como se desaparecessem da sua história original de órfãs de pai. Até que, tardia, mas finalmente providas e protegidas pelo que alcançaram à sombra desses papais de mentirinha, se vestem as roupas de super e renegam o papel anteriormente escrito. Agora, podem espiar todo o ressentimento de tempos infinitamente vividos de abandono e solidão... Ou então se resignam e se cronificam filhas postiço-bastardas daqueles amores não tidos.


E seus filhos, elas os criarão, à imagem e semelhança daqueles que as abandonaram. E eles seguirão, assim, reproduzindo eternamente a história percorrida até então. Por todo o sempre: filhos sem pais, moldados por mães mártires, mortes à vista...


Onde estão os pais? perguntam-se as mães... Estão onde sempre estiveram: no colo delas, realizando em seus regaços a perda dos partos, o vazio dos nascimentos, o fim daquela plenitude pulsante e ao fim tão dolorosa. Estão os pais perdidos sob essas saias adoradas, desejadas no seu avesso, na nudez da sua ausência.


E os filhos, como ficarão? Como crescerão? Pra onde irão? A lugar nenhum, posso garantir. A não ser que re-cortem esse elástico cordão mais que cicatrizável, eternamente regenerável, ninho de células-tronco matrizes de corações despedaçados.