Eu falara pra ela que sou vários.
Quantos, me perguntei depois? Médico e louco já estavam na pré-lista. Nomeavam,
inclusive, o blog. Mas são apenas dois...
Pensando em como a realidade me
limita, não só os desejos, os sonhos, mas também a visão das coisas, lembrei de
mais um: o poeta. Mesmo sendo à moda antiga, adorando as rimas sem preconceito
de classe – ricas ou pobres - ele ultrapassa os limites do real, dá contornos aos dias e noites e pinta os
fantasmas com cores tão vivas, que eles se transformam em arco-íris. Por suas
mãos, as dores, passando a ter palavras que lhes signifiquem, terminam por ter
som. E assim, podem cumprir seus destinos e terminar. Dor existe pra acabar, desaparecer
no éter... Sem contar que o poeta faz a passagem entre a luz e a escuridão, pra
lá ou pra cá... infinitamente... E assim, meus medos mais infantis se defrontam
com um personagem-entidade poderoso que os espanta.
Muitas vezes, ele tem como parceiro
o músico. Esse, na verdade, é antes de tudo um cantante, um cantor. Espelhado
na cigarra, sem desmerecer a faina da formiga, ele canta em todos os cantos,
acha o canto a forma mais linda de estar na Vida e então, canta mais e mais e
mais... Também sem parar. Como se fosse explodir, e seus mil pedaços formassem
novamente um todo, que será uma nova canção. E assim se repetiria sempre e
sempre,como numa ladainha, só que mais pra ciranda, que circula como pião porque
tem o pé no chão.
Mas antes de todos vem o palhaço.
Esse é antigo, encarnou nesse corpo carregado por um velho espírito e ficou.
Encontrou nesse cavalo um companheiro seguro, leal e até certo ponto,
confortável. É que palhaço é sempre um
homem triste que se alimenta de risos. E eu trago essa tristeza radical,
nascida inda no útero escuro e sombrio onde não pude dormir em paz. Onde
desenvolvi a atenção que hoje ainda me tira o sono e atrapalha na hora de deitar
no colo amado, no colo desejado...
Então, o palhaço surgiu pra trazer
algazarra, barulho de criança, que é o melhor da Vida. Assim como para, igual bobo da corte, mostrar
que a cueca do rei está sempre furada. O palhaço desperta gargalhadas
adormecidas, traz levezas pro ar, mesmo estando sempre triste. E essa tristeza
ancestral o obriga a ter os olhos molhados e enormes lágrimas ambíguas que
escorrem aguando e borrando o sorriso pintado.
O eu palhaço, à frente dessa
melancolia contida, pisando nesse picadeiro multicor, causa enormes confusões.
Entre eles, de a platéia não conseguir ver seu espírito sério, o comprometido
esforço em causar sorrisos, em cavucar almas entristecidas na busca das
crianças que cada um escondeu. É não ser reconhecido como esse ser profundo, um
guerreiro da paz e da luz, um arauto da Vida.
Enfim, eu sou mesmo é tantos que
até canso e me esqueço de quem sou...