Com o peito apertado de tão vazio, pedalava distraidamente de volta
pra casa e simplesmente se fazia paisagem, que é jeito cômodo de se estar na vida.
Sua terra tem tantas infinitas belezas, que se nela um verdadeiro rio inda houvesse,
este seria mais belo que o Tejo, não somente por ser o rio da sua aldeia, mas simplesmente
por ser ela, sua cidade, das terras a mais bela. Mesmo que ele nem soubesse, de tão acostumado que com ela era...
Mas pedalava suavemente nesta doce distração do ser, quando...
Mas pedalava suavemente nesta doce distração do ser, quando...
Não,não! Não foi nada disso...
Nem o espaço nem a cena eram exatamente estas...
Foi assim, posso assegurar: ia
ele caminhando pensativo, mãos nos bolsos, olhando mais o chão que o à frente,
observando mais as pedras multiformes que desenhavam o caminho que pisava do
que o horizonte que talvez pudesse aparecer depois de cada esquina, quando
despontou uma chapinha. É, uma tampa de garrafa de vidro, de cerveja ou
refrigerante... Aos seus olhos, ela se fez sedutora bola, com todas as possibilidades
de prazer que uma bola oferece a um menino.
Ele caprichou no chute, como se
fosse um pênalti. Desde a inspiração profunda e rápida, quase seca, eu diria,
até o gesto final. Corpo inclinado, colocado lateralmente como Flavio – o Minuano –
célebre centroavante artilheiro do Fluminense no fim da década de 60 - ele bate
com a chapa do pé, tentando o gol imaginado. O chute sai mascado – falta de
treino – e a chapinha espirra fraca, sem sentido e frustrante como uma ejaculação precoce. A
angústia aumenta e é como se o espaço encolhesse no peito do artilheiro
derrotado. A ausência que o inundava desde a véspera transborda, como um
amazonas desertificado. Falta o ar, o chão se racha, sente a boca seca...
A necessidade de seguir o faz levantar
os olhos. À sua frente, ele lê num papel preto e branco colado no muro ao lado
do cemitério: “Trago a pessoa amada em três dias. Não é trabalho.”
Sorri docemente e seus olhos,
novamente cheios de luz, têm a inocência dos olhos de um menino. Anota o
telefone e segue, agora absolutamente feliz!
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